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PSICOLOGIA E DIREITOS HUMANOS: INSPEÇÃO NACIONAL REVELA VIOLAÇÕES EM 100% DAS COMUNIDADES TERAPÊUTICAS VISITADAS

PSICOLOGIA E DIREITOS HUMANOS: INSPEÇÃO NACIONAL REVELA VIOLAÇÕES EM 100% DAS COMUNIDADES TERAPÊUTICAS VISITADAS


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Inspeção nacional revela violações em 100% das Comunidades Terapêuticas visitadas

Relatório aponta trabalho forçado, restrições de liberdade e práticas manicomiais. Representação do CRP 01/DF no Conselho de Saúde do DF reforça que tais instituições “não são cuidado — são violência”

O Relatório da Inspeção Nacional em Comunidades Terapêuticas — conduzido pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) e Ministério Público Federal (MPF) — identificou irregularidades em 100% das instituições visitadas, incluindo fraude trabalhista, laborterapia forçada, práticas de caráter manicomial e outras violações de direitos humanos. A investigação traz repercussões diretas para as políticas públicas de cuidado e para o debate sobre o financiamento público dessas entidades.

A Procuradora do Trabalho Jeane Colares, integrante do Grupo de Trabalho Interinstitucional MPF/MPT responsável pela coordenação da inspeção nacional, afirma que as violações trabalhistas encontradas são estruturais: “As comunidades terapêuticas não mantêm uma equipe mínima de empregados capacitados e regularmente contratados”, denuncia, explicando que as instituições contratam ex-acolhidos sem registro, submetendo-os a longas jornadas e baixos salários. Segundo ela, trata-se de um ciclo de vulnerabilidade, no qual essas pessoas acabam aceitando as condições impostas pelas entidades por não terem para onde retornar após o período de acolhimento e por, muitas vezes, se encontrarem em uma situação de extrema fragilidade.

O relatório também aponta uso indevido de trabalho forçado — frequentemente chamado de “laborterapia” pelas instituições. Jeane Colares é categórica ao afirmar que, nessas condições, trata-se de dumping social e de violação direta da legislação trabalhista. Frente às irregularidades, o MPT já instaurou procedimentos em todas as comunidades inspecionadas.

Para o psicólogo e professor da Universidade de Brasília (UnB) Pedro Costa, que integra o Conselho de Saúde do Distrito Federal (CSDF) ocupando a cadeira atualmente destinada ao CRP 01/DF, as evidências da inspeção confirmam um padrão já reconhecido pelas instâncias de fiscalização e pela literatura especializada. Ele é contundente ao afirmar que “comunidades terapêuticas são instituições de violência” e ao enfatizar: “Violência não é cuidado.” Pedro ressalta que as práticas identificadas não são exceções, mas expressão da natureza dessas instituições, que se aproveitam do fato de não serem formalmente tipificadas como instituições de saúde nem de assistência, o que permite, na prática, que elas atuem em ambas as políticas. “Essa ausência de articulação das CTs com SUS e SUAs que o relatório aponta não é um acaso, não é um desvio, mas diz da própria natureza manicomial dessas instituições. E os efeitos que isso produz é uma retroalimentação do seu caráter asilar”, explica o psicólogo, “por trás dessa retórica do acolhimento que a gente vê de fato é controle, disciplina, isolamento, privação de liberdade e as demais características que o próprio relatório apresenta”.

Entre as violações mais graves estão restrições de comunicação, retenção de documentos, isolamento prolongado, imposições religiosas e internações involuntárias. Para Pedro, essas violações representam um choque frontal com os princípios éticos da Psicologia, de cujo papel seria denunciar, fiscalizar e enfrentar essas práticas, garantindo que o cuidado seja em liberdade. A inspeção ainda revela permanências extensas, “reacolhimentos” recorrentes e utilização de trabalho compulsório como forma de manutenção das próprias entidades. Pedro explica por que essa prática é incompatível com qualquer perspectiva terapêutica: “A chamada laborterapia, na concretude, é trabalho não pago, forçado, em condições degradantes e análogo à escravidão. E violência não é terapia.” Ele explica que, além de violar direitos trabalhistas, o uso da laborterapia como eixo central do modelo das comunidades terapêuticas incute nas próprias pessoas a naturalização da violência, levando-as a acreditar que o sofrimento imposto é parte necessária do tratamento. Isso produz danos duradouros à saúde física e mental.

Outro ponto grave identificado é a ausência de articulação das CTs com a rede pública de saúde e assistência social. Isso compromete totalmente a continuidade do cuidado e reproduz uma lógica de confinamento. “Isso não é um desvio — é expressão do caráter manicomial dessas instituições”, afirma Pedro Costa. Segundo ele, a permanência das CTs dentro da Portaria 3.088/2011 e nos fluxos institucionais do Sistema Único de Saúde (SUS) e do Sistema Único de Assistência Social (SUAS) cria a falsa impressão de legitimidade, mas na prática elas contradizem os próprios princípios das políticas públicas que afirmam integrar.

Diante de irregularidades sistêmicas, Jeane Colares defende fiscalizações regulares, entrevistas individuais com acolhidos, acompanhamento dos Projetos Terapêuticos Singulares (PTS) e capacitação de equipes estatais para monitoramento efetivo. Já Pedro Costa reforça que o caminho para políticas de cuidado em álcool e outras drogas não exige inventar nada novo, mas reafirmar o que já existe como conquista civilizatória: “Os caminhos passam pela defesa do SUS, da reforma psiquiátrica, da redução de danos e dos serviços substitutivos (como CAPS, Unidades de Acolhimento, CRAS, CREAS e Centros POP). Cuidado só é cuidado se for em liberdade.”

A participação do CRP 01/DF na inspeção se dá por meio da representação na cadeira de controle social no CSDF, reforçando o compromisso do atual Plenário com a defesa intransigente dos direitos humanos, o combate a práticas manicomiais, o fortalecimento da RAPS e da política de redução de danos, além do enfrentamento às violações de direitos em Comunidades Terapêuticas.



Jeane Colares é Procuradora do Trabalho na Procuradoria Regional do Trabalho da 22ª Região (PI), integrante do GT MPF/MPT responsável pela coordenação da inspeção nacional. Graduada em Direito pela UFPI e Mestre em Direito pela UCB, atua em enfrentamento às violações trabalhistas e à exploração de trabalhadores vulneráveis.

Pedro Costa é psicólogo, mestre e doutor pela UFJF, com pós-doutorado na Universidade Michoacana de San Nicolás de Hidalgo (México). Professor de Psicologia Clínica da UnB e integrante do Conselho de Saúde do Distrito Federal, na cadeira atualmente ocupada pelo CRP 01/DF.


#DescreviParaVocê: imagens coloridas contam com parte do conteúdo textual acima, com as fotografias de rosto de Jeane Colares (mulher branca, sorrindo, com cabelos longos, lisos e castanhos) e Pedro Costa (homem branco, sério, com cabelos lisos, barba e óculos de grau), além da marca gráfica do CRP 01/DF.


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