| 28/06: Dia do Orgulho LGBTQIAPN+ |
Psicologia e Orgulho LGBTQIAPN+: uma entrevista com Ruth Venceremos”
CRP 01/DF dialoga com a drag queen parlamentar sobre como a Psicologia pode ser mais inclusiva, respeitosa e transformadora para as realidades LGBTQIAPN+
No Dia do Orgulho LGBTQIAPN+, é essencial refletirmos sobre as conquistas e os desafios da comunidade, especialmente no que diz respeito à inclusão e ao reconhecimento das diversas identidades que compõem esse espectro. Para abordar essa temática com profundidade, conversamos com Ruth Venceremos, militante do MST e ativista LGBTQIAPN+, diretora do Distrito Drag, pedagoga e mestre em Educação pela Unicamp, além de suplente de Deputada Federal pelo DF. Ruth é uma voz importante na defesa dos direitos da população LGBTQIAPN+ e defende a interseccionalidade como ferramenta fundamental para que a Psicologia seja capaz de acolher e entender a complexidade das realidades enfrentadas.
Em sua trajetória, Ruth tem se dedicado a lutar por um mundo mais justo e igualitário para as pessoas LGBTQIAPN+, com ênfase no reconhecimento das múltiplas camadas de opressão que envolvem questões como classe, raça, gênero e sexualidade. Para ela, a Psicologia precisa se reinventar, acolhendo esses cruzamentos de identidades e, acima de tudo, não invisibilizando as lutas das pessoas que vivem essas intersecções. Em suas palavras: "O orgulho é a afirmação das nossas existências em uma sociedade que tentou, e ainda tenta, nos apagar."
Neste bate-papo, Ruth compartilha suas perspectivas sobre como a Psicologia pode – e deve – evoluir para abraçar a diversidade de sujeitos e suas histórias, além de discutir como o Conselho Regional de Psicologia pode ser mais ativo na promoção de uma abordagem antirracista, anticolonial e interseccional.
1. Ruth, você tem uma trajetória marcante na defesa dos direitos LGBTQIAPN+. Na sua visão, qual é o papel fundamental da Psicologia na luta por dignidade, saúde mental e cidadania para essa população?
RUTH VENCEREMOS: A Psicologia tem um papel essencial na defesa das vidas LGBTQIAPN+, especialmente no enfrentamento às tentativas históricas de aniquilação das nossas subjetividades. O saber psicológico, enquanto ciência e profissão comprometida com os direitos humanos, precisa contribuir para a compreensão das violências estruturais que nos atravessam e para a promoção de existências mais dignas.
2. Como você avalia os avanços e os desafios que ainda enfrentamos no combate à LGBT+fobia institucional, especialmente nos espaços de cuidado e políticas públicas?
RUTH VENCEREMOS: Avançamos no reconhecimento legal de direitos, como o casamento civil igualitário e a criminalização da LGBTfobia, mas a institucionalidade ainda nos falha. A LGBTfobia estrutural permanece presente nas políticas públicas, seja na ausência de protocolos específicos, seja na reprodução de violências simbólicas ou no não acesso à direitos básicos. Em espaços de cuidado, como hospitais, escolas ou equipamentos de assistência social, ainda é comum que pessoas LGBTQIAPN+ enfrentem discriminação, deslegitimação de suas identidades e falta de preparo técnico de profissionais. O desafio é fazer com que as instituições deixem de nos enxergar como exceção e passem a reconhecer nossos corpos e nossas demandas como legítimos e urgentes.
3. O que você considera essencial para que psicólogas(os/es) atuem de forma ética e comprometida com os direitos humanos da população LGBTQIAPN+?
RUTH VENCEREMOS: É essencial que psicólogas(os/es) compreendam que a neutralidade não existe quando se trata de direitos humanos. A ética profissional exige posicionamento. Isso implica rejeitar práticas e discursos que reforcem preconceitos, patologizações ou exclusões. É preciso compromisso com uma escuta qualificada, com o respeito à identidade de gênero, nome social e orientação sexual, e com a constante atualização sobre as normativas do próprio Sistema Conselhos de Psicologia. A atuação ética passa, portanto, por uma postura antidiscriminatória, interseccional e implicada com a transformação das estruturas que ainda produzem sofrimento para a população LGBTQIAPN+.
4. Você poderia comentar sobre como as questões de gênero, sexualidade, raça, classe e território se cruzam na sua militância? Por que é urgente que a Psicologia também atue a partir de uma perspectiva interseccional?
RUTH VENCEREMOS: Minha militância nasce da vivência e da coletividade: sou LGBTQIAPN+, sou uma bicha preta, sou nordestina, venho do MST, onde aprendi desde cedo que as conquistas são resultados de muita luta. Essas dimensões não estão separadas. Elas se entrelaçam e revelam como o sistema de opressões atua de forma combinada para nos excluir e nos silenciar. É por isso que a interseccionalidade é uma ferramenta urgente para entender as realidades complexas que vivemos. A Psicologia que não leva em conta esses cruzamentos, corre o risco de invisibilizar sujeitos e reproduzir violências. Uma atuação interseccional permite uma escuta mais sensível, mais justa e mais transformadora.
5. Neste Dia do Orgulho, qual mensagem você gostaria de deixar para profissionais da Psicologia e para toda a sociedade sobre resistência, afeto e construção de um futuro mais justo para todes nós?
RUTH VENCEREMOS: O orgulho é a afirmação das nossas existências em uma sociedade que tentou, e ainda tenta, nos apagar. Às pessoas profissionais da Psicologia, deixo um convite e um chamado: que sejamos pessoas aliadas na construção de um país onde ninguém precise abrir mão de quem é para ser cuidado. Que a escuta clínica e a atuação institucional estejam a serviço da liberdade, da dignidade e da justiça.
DE PSI PARA PSI
Leia mais sobre Psicologia e os direitos das pessoas LGBTQIAPN+, incluindo referências técnicas do Sistema Conselhos de Psicologia para a atuação profissional com esse público e outros posicionamentos:
- Referência Técnica "Atuação de psicólogas, psicólogos e psicologues em políticas públicas para a população LGBTQIA+", por CREPOP Nacional – CFP (Publicada em: 28/06/2023) - https://crepop.cfp.org.br/wp-content/uploads/sites/34/2023/06/RT_LGBT_crepop_Web.pdf
- Cartilha "Acolhimento às pessoas LGBTQI+ nos serviços de saúde – orientações voltadas para profissionais da Psicologia e demais áreas da saúde", por CRP 01/DF (Publicada em: 2020) - https://crp-01.org.br/page_3942/Guias,%20cartilhas%20e%20manuais
- Artigo "A luta antimanicomial no combate à LGBTQIAP+fobia", por Felipe de Baére (Publicado em: 17/05/2024): https://crp-01.org.br/notices/9532
#DescreviParaVocê: a imagem colorida conta com parte da informação textual acima, em uma chamada para a leitura da entrevista. Além disso, vê-se a marca gráfica do CRP 01/DF e uma fotografia de Ruth Venceremos, uma pessoa negra, cabelos ondulados loiros, roupa social preta, falando no microfone enquanto lê um papel branco.